segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Não sei dançar

Uns tomam éter, outros cocaína.Eu já tomei tristeza, hoje tomo alegria.Tenho todos os motivos menos um de ser triste.Mas o cálculo das probabilidades é uma pilhéria...Abaixo Amiel!E nunca lerei o diário de Maria Bashkirtseff.Sim, já perdi pai, mãe, irmãos.Perdi a saúde também.É por isso que sinto como ninguém o ritmo do jazz band.Uns tomam éter, outros cocaína.Eu tomo alegria!Eis aí por que vim assistir a este baile de terça-feira gorda.Mistura muito excelente de chás...Esta foi açafata...- Não, foi arrumadeira
Não, foi arrumadeira.E está dançando com o ex-prefeito municipal:Tão Brasil!De fato este salão de sangues misturados parece o Brasil...
Há até a fração incipiente amarelaNa figura de um japonês.O japonês também dança maxixe:Acugelê banzai!A filha do usineiro de CamposOlha com repugnânciaPara a crioula imoral,No entanto o que faz a indecência da outraÉ dengue nos olhos maravilhosos da moça.
E aquele cair de ombros...Mas ela não sabe...Tão Brasil!Ninguém se lembra de política...
Nem dos oito mil quilômetros de costa...O algodão do Seridó é o melhor do mundo?...
Que me importa?Não há malária nem moléstia de Chagas nem ancilóstomos.A sereia sibila e o ganzá do jazz-band batuca.
Eu tomo alegria!

Manuel Bandeira....(Petrópolis, 1925)

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